Fui convidado para ser um dos juízes de um festival de música evangélica. Recusei. Não que discorde de tais festivais. Mas porque o festival gospel a que fui convidado a comparecer vinha sendo anunciado também como um tempo de adoração e louvor. E é preciso diferenciar um show musical, de uma reunião em torno do altar.
Adoração envolve altar; show, palco. Entre o palco e o altar há um grande abismo. Sim, porque no altar nosso alvo é Deus, e o alvo de Deus somos nós. Homem e Deus interagem a ponto de haver um amalgama de sentimentos de alegria e tristeza, de emoção e de gozo espiritual. No altar Deus lança seu holofote sobre nós, não para sermos vistos pelo auditório, mas para nos iluminar o interior. No show, os holofotes apontam para o palco, para nós, para que os outros nos vejam! As luzes do show iluminam o exterior. A de Deus, o interior.
Não quero afirmar com isto que o palco não seja lugar de adoração. Nada disto. Porque não tenho em mente apenas o espaço físico, o tablado de madeira, ou seja o que for. Muita adoração pode se dar no “palco”, mas não como lugar que nos projeta para os homens, e sim que nos identifica com Deus. Na adoração, podemos transformar o palco em altar.
No palco dos festivais, as atenções estão voltadas para o homem. Servem para destacar sua técnica, sua música, sua voz e habilidades. Quando estamos no altar, nada disso é preciso. Altar é lugar de sacrifício e de morte; de entrega e de abandono a Deus. É onde morremos para nossas paixões, desejos e sonhos. Ao contrário do altar, o palco é onde nos projetamos diante de todos – mas nem sempre nos projetamos para Deus!
Os festivais podem até servir como meio de evangelização, como forma de mantermos comunhão com o corpo de Cristo, local de expressarmos amor e carinho aos membros do corpo, tempo de festa e alegria, mas jamais como encontro de adoração. Sim, porque adoração não combina com palco! Adoração só combina com altar! Afinal, adoração é um estilo de vida que nem sempre combina com o altar de Deus!
Acho os festivais de música gospel uma maravilha; uma oportunidade de conhecermos novos amigos, cantores, músicas, de estudar e perceber as tendências musicais; de levar amigos para serem evangelizados – coisa rara – mas que esperamos aconteça. E eu como gosto de estudar as tendências musicais evangélicas do país tiro deles proveito. Mas, por favor, tratemo-los como festivais. Certa ocasião um cantor internacional esteve em minha cidade para uma noite de apresentação. O custo do ingresso foi bem salgado! E mesmo assim, como o cara é famoso, umas dez mil pessoas compareceram ao ginásio. Ele dançou, pulou, cantou, e lá pelas tantas tentou levar o povo a adoração, à presença de Deus. Mas não funcionou. Os que ali estavam pagaram ingresso caro para vê-lo cantar, e não estavam dispostos a morrer no altar! Ninguém paga entrada para subir no altar; pagam para os shows! Ele tentou duas vezes e desistiu!
Foi quando percebi que show não combina com altar! E quase sempre se cobram ingressos para shows! No altar o ingresso é a própria vida. Quando se tenta cobrar ingresso, automaticamente pisamos no tablado do palco! O músico e sua equipe quando estão no palco querem ser vistos. E apesar de tentar levar o povo a olhar para Cristo, os olhos da multidão estarão sempre neles, porque é sobre eles que brilham as luzes dos holofotes. E eles sabem disto. Porque se vestem de maneira diferente, usam tatuagens, bandagens na cabeça, bonés com abas para trás, correntes penduradas na cintura e fazem acrobacias com seus instrumentos musicais. Lamentavelmente tentam vender a idéia de que estão adorando a Deus, quando na realidade, estão levando as pessoas a adorarem suas músicas, seu estilo e a eles mesmos.
E enganam-se! Sim, porque o palco oferece oportunidade ímpar a quem nele se apresenta. O cantor ou músico recebe seu cachê, vende seu material, cumpre o compromisso estipulado anteriormente de cantar um reduzido número de hinos ou cânticos, e volta para o seu hotel. Deixa o palco deslumbrado consigo mesmo, atraca-se aos prazeres de sua carne, na privacidade de seu quarto de hotel, em orgias mentais ou física, com a conta bancária mais recheada. E em época de campanhas eleitorais, o cachê é mais alto. Tudo em nome de Deus! Em nome da fé! Em nome desse mercantilismo descarado que vem varrendo a nação brasileira. Especialmente agora que ser gospel virou coisa chique!
Já o músico ou cantor que vai para o altar, fica ali, ministrando, orando com as pessoas, aconselhando, ajudando e rendendo-se aos pés de Cristo. Para estes não existem holofotes nem apupos, porque tudo o que é colocado no altar, queima em sacrifício a Deus. Se pudéssemos visualizar, veríamos a fumaça subindo verticalmente aos céus.
E nestes últimos anos percebemos que uma ponte de acesso foi construída entre o altar e o palco. Porque alguns começaram no altar, como adoradores, morrendo para si mesmos, mas acabaram seduzidos pelo palco. Faça os cálculos de quanto rende a um cantor, que se diz adorador, apresentar-se quase todos os dias algures no país. Sem cobrar cachê, e vivendo apenas de boas ofertas, ele supera, três vezes mais o salário de um ministro de Estado! É aqui que altar e palco se confundem na mente do adorador! Ele se imagina no altar, e nem percebe que está no palco!
São os Hofini e Finéias da igreja, que se acostumaram ao altar, aos sacrifícios, e atravessam a ponte para o palco, deliciando-se com os prazeres que podem proporcionar a vida religiosa, e regressam ao altar, como se nada tivesse ocorrido. Aliás, não apenas os cantores, mas pastores e líderes fazem todos os dias a travessia do altar para o palco, porque neste não se exige sacrifícios. Esquecem, no entanto, que no palco o líder é Belial, que carrega consigo a comitiva de demônios, entre eles Mamom, o tesoureiro de Lúcifer.
O lastimável nisto tudo, é que as mais lindas melodias surgem no altar, mas são entoadas no palco, porque ali rendem mais!
Entre o altar e o palco há uma travessia invisível e de fácil acesso! Só quem tem radar espiritual consegue detectá-la!
Pr. João A. de Souza, tem quatro livros sobre louvor e adoração editados pela Betânia e um pela Editora Faith