Os evangélicos consomem produtos como qualquer cidadão desse país. Usam telefone celular, automóveis, freqüentam shoppings, alugam vídeos, lêem jornais, livros, compram Cds e, por conseguinte, produzem e produzem bastante! Gravadoras, jornais, editoras, empresas fabricantes de produtos alternativos como quadros, canetas, relógios, celulares, e por aí afora vai a lista! Editoras de cunhos confessional produzem toneladas de literatura consumidas em grande parte por membros da confissão religiosa, e vendem muito, muito mesmo! E consumimos também os produtos da indústria do entretenimento!
Observo, no entanto que o mercado dos evangélicos vem perdendo aquele toque de espiritualidade, de amor, de espírito evangelizador, operando nos mesmos padrões do comércio mundial. É um tema difícil de ser abordado porque todo mercado requer lucratividade; ninguém consegue operar sem o ônus do mercado: impostos, taxas, fretes, INSS, PIS, FGTS – e quanta coisa mais! e isso tudo é repassado diretamente ao consumidor. Uma pergunta poderia ser feita: poderíamos oferecer a nossos irmãos de fé, a preços menores, essa gama de material cristão tendo como objetivo o seu crescimento espiritual? Como operavam no passado algumas missões de fé que produziam a preços acessíveis jornais, revistas e livros de edificação espiritual. Como o velho O. S. Boyer que chegava numa Escola Bíblica e distribuia “livros, livros às mãos cheias”, como em obediência ao poema de Castro Alves.
Essa tensão entre mercado e espiritualidade precisa voltar à tona de vez em quando, do contrário perdemos o rumo e a visão espiritual em detrimento do lucro e do enriquecimento material. E essa tensão tem de ser resolvida não apenas no que é industrializado – livros, cds, vídeos, gravações gerais, em que se recolhe imposto – mas também na chamada indústria do entretenimento. Não se pode argumentar de que a atividade de certos músicos e cantores no meio evangélico não seja a de meramente entreter. Onde estão os que cantam por amor, que se submetem em hospedar-se em residências de irmãos, que dispensam hotéis caríssimos, que não exijam cachês comparáveis até mesmo aos cobrados pelos artistas do mundo?! Nada disso, esse mercado com máscara de espiritualidade esconde cantores e artistas sem vida de justiça que utilizam os dons para seu enriquecimento pessoal. Por trás desses altos cachês estão os compromissos com as gravadoras! Alguns desses cantores vêem-se repentinamente presos às demandas de seus empresários balaônicos, que com esperteza conseguem auferir lucros com os dons dos consagrados servos de Deus, levando esses últimos ao mesmo laço em que eles caíram sob condenação divina!
Não estamos tratando aqui se é ético ou não a comercialização. Algumas pessoas citam a limpeza que Jesus fez no templo expulsando dali os mercadores, argumentando que não se deve vender na casa de Deus. Primeiro, que o lugar físico que chamamos de igreja não é a casa de Deus. As pessoas é que são a casa de Deus. Segundo que a limpeza não foi no templo – onde estava a arca e o santuário, mas na área do templo. O problema não é o de vender produtos, pois no caso em mente os judeus vendiam e compravam junto ao templo animais que eram oferecidos em sacrifício. Nos dias de Jesus os judeus comercializavam animais que eram oferecidos a Deus. Está na lei. O comércio era bíblico!
“Quando o caminho te for comprido demais, que os não possas levar, por estar longe de ti o lugar que o Senhor, teu Deus, escolheu….então, vende-os, e leva o dinheiro na tua mão….este dinheiro dá-lo-ás…por vacas, ou ovelhas, ou vinho, ou bebida forte, ou qualquer coisa que te pedir a tua alma…” (Dt 14.18-29).
A questão, portanto não está na compra e venda de material, mas na ganância, no lucro fácil e na extorsão. Os comerciantes junto ao templo exploravam os pobres que queriam oferecer sacrifícios a Deus. O adorador vendia em Dã uma ovelhinha por um preço, e em Jerusalém descobria que o dinheiro da venda da ovelha não dava para comprar um par de rolas!
Seria isto o que Pedro queria dizer ao escrever sobre os que, movidos pela avareza, fazem comércio de nós, com palavras fictícias? “Também, movidos por avareza, farão comércio de vós…” (2 Pe 2.3). Por isso proponho uma reflexão sobre o tema. Os pastores que se submetem aos altos cachês são também culpados diante de Deus; os que exploram os fiéis evangélicos com preços exorbitantes são também culpados. E culpados também algumas das grandes empresas evangélicas que não cumprem com seu dever de pagamento de direitos autorais. Quantos de nós, escritores, dependemos para sobreviver dos direitos autorais que nos são negados? Acompanho o esforço de certos editores em manter a preços razoáveis da literatura evangélica – que, digamos: antigamente os livros evangélicos eram mais baratos que os seculares, e hoje, se comparados, são mais caros!
Não podemos – nem que tenhamos que pagar o custo – abandonar nossa missão de edificação da igreja; temos que aprender a andar sobre essa tênue linha divisória entre o comércio e a fé; e manter o equilíbrio entre mercado e espiritualidade; cuidar e fiscalizar para que a Fé de nossos irmãos não seja vituperada pelo abuso, escárnio e necessidade de consumo!
Jamais devemos esquecer que logo adiante nos espera a Eternidade e o julgamento divino não poupará nem mesmo os bem intencionados!