Eu tive um sonho!

Quando eu era jovem, sonhei. Sonhei de olhos abertos. Como numa visão, sonhei com uma igreja pura, dinâmica e vitoriosa, e persegui o sonho, trabalhando em busca da igreja perfeita. Não havia dúvidas, eu sonhava os sonhos de Deus; o sonho de uma igreja restaurada, que seguisse unicamente os ensinos de Jesus e de seus santos apóstolos. Sonhei com uma igreja vigorosa, humana e transcendental, que não se submetesse aos ditames humanos, nem fizesse alianças com ricos, políticos e comerciantes da fé. E saí à busca da igreja autêntica.

Persegui este sonho, e coloquei diante de mim a prioridade de trabalhar e dar a vida em prol de uma igreja restaurada.

Viajei pelos mais remotos recantos do país. Onde havia uma pessoa insatisfeita com o estado atual da igreja eu ia até lá e a inflamava com o sonho, até que ela começasse uma nova igreja em sua casa. Agia, como faziam os evangélicos no passado: onde havia um católico insatisfeito com a igreja, chegávamos lá e começávamos uma. (Vanda ficava doente em casa, cuidando dos filhos, contando as moedas para o sustento daquele dia. Cardíaca, conseguiu vencer a doença e ganhou um novo coração. De tanto sofrer e amar a igreja fiquei também cardíaco, mas Deus me curou da angina).

Na busca de uma igreja bíblica, diferente, entendi mal os meus irmãos e eles também me entenderam mal. Entramos em atrito. Eu e eles. Eles e eu. As denominações passaram a ser para mim uma abominação babilônica porque não se encaixavam no sonho que eu perseguia. E já não era mais sonho, era uma visão! Não media sacrifícios, viajando doente, dias e dias de ônibus, ou num carro velho, pois eu tinha um sonho de um dia ver uma igreja diferente. Gastei trinta anos de minha vida na busca deste sonho.

Tornei-me um pregador da visão de que uma nova igreja era possível, acompanhando de perto o nascimento de novas obras por todo o país. Nós, os jovens da época criamos comunidades que se espalharam, e que estouravam como pipocas por toda parte. Não vou citar nomes, porque esses meus amigos cobrem a nação brasileira com suas comunidades, seus programas de tevê, revistas e livros. Eu também tenho livros publicados pelas melhores editoras evangélicas do país. E assim, todos os que perseguiam o mesmo sonho, terminaram organizando suas próprias denominações. Menos eu.

Trinta anos depois vi que a igreja de meus sonhos ainda está tão distante, mas que é uma possibilidade. Os jovens de meu tempo que também sonharam com uma igreja restaurada, de alguma forma criaram seus próprios ministérios e suas denominações. Felizmente, estes que formaram suas denominações – ainda que achem que não são – decidiram organizar-se melhor para perseguir o sonho da igreja diferente e restaurada. E pelo visto, são felizes.

Alguns deles honestamente admitem: “Nós somos uma denominação”. E criaram seus estatutos, suas regras de fé, seus ministérios, expondo com clareza suas idéias e regras de trabalho diante de seus obreiros. Outros amigos meus continuam afirmando que não fundaram denominações; que não têm uma organização que os inclua nacionalmente; que todas as igrejas sob sua supervisão são locais. Mas na realidade criaram novas denominações, ainda que com igrejas independentes, já que todas submetem-se a autoridade de um líder extra-local, isto é, de alguém com ministério apostólico. São igrejas que operam em nível nacional, que não têm estatutos, nem registro oficial, mas não passam de denominações, com um agravante: Decidem sozinhos, e os estatutos, não estão no papel, mas bem definidos na cabeça de seus líderes.

Honestamente não sei qual das formas é a melhor: submeter-se a algo explícito e estatutário ou ao que está na cabeça do líder, que decide sozinho ou em grupo o próximo passo da vida do obreiro e da igreja.

Agora, vi o meu sonho passar ao meu lado, como se fosse outro eu, transformando-se em múltiplas formas de igrejas. E entendi que todos estávamos certos. As denominações eram necessárias, eu também era necessário, e também meus amigos que comigo sonharam e que souberam materializar melhor seus sonhos. Sei que seguem a jornada felizes, e imagino, sem preocupações financeiras, viajando pelo mundo todo, liderando o que notoriamente souberam construir: Uma nova igreja. Ela existe. E está em todo Brasil.

E as denominações que eu não compreendi e que não me compreenderam quando eu era jovem continuaram sua marcha, pregando o evangelho de Jesus Cristo. Os que eu não entendia, por serem denominacionais demais, continuaram crescendo, formando novas igrejas e dando sua contribuição para a edificação do reino de Deus.

Trinta anos depois, ponho-me à margem de tudo, como o peregrino que vê as caravanas passarem rumo a alguma cidade; vendo meu sonho se concretizar de formas diferentes, mesclando-se na grande igreja brasileira. Comunidades e mais comunidades, igrejas e mais igrejas foram iniciadas pela ousadia de homens e mulheres que como eu tiveram uma visão e sonharam. O profeta Joel tinha razão: a visão é para os jovens, os que têm ainda vigor e energia para novas investidas.

E continuo com o sonho, admitindo agora, que é possível, onde estivermos, melhorar, para que a igreja alcance os objetivos de Deus na terra. Os sonhos de Deus, como diz o hino da Ludmila, não morrem. Os nossos se desvanecem como a névoa ao calor do sol.

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