Salmo 8

Introdução.

Este é um Salmo de ações de graças por Deus haver colocado o homem acima de todas as demais criaturas da terra. O Salmo é citado pelo autor do livro de Hebreus com referência a Cristo. Seja ou não considerado uma profecia, ou porque descreve o caráter de nosso Senhor, não se sabe ao certo. Os comentaristas afirmam que o autor está celebrando a glória de Jeová, e o poder e dignidade que ele conferiu ao ser humano. Pode assim ser aplicado, ilustrativamente a nosso Senhor, porque ele não obteve tal grandeza até que se tornou humano, e foi exaltado acima de todo principado, e poder, e autoridade e domínio, ganhando um nome acima de todo nome.

Sua estrutura e as lições nele contidas são impressionantes. São nove versículos de profunda riqueza e revelação.

W.L. Watkinson, no Preacher´s Commentary (Nova Iorque, 1892) dá a este Salmo o título de o evangelho das estrelas.

A seguir, o comentarista acima faz o seguinte esboço que traduzo e forneço aos meus leitores.

V. 1: O Evangelho das Estrelas

Versículo 1: “Ó SENHOR, Senhor nosso, quão magnífico em toda a terra é o teu nome! Pois expuseste nos céus a tua majestade”.

Somos levados a meditar:

I. A criação recebe a glória de Deus.

O salmista não vê a criação como um Deus, nem tão pouco independente de Deus, mas como um espelho que reflete a glória de Deus. “Expuseste nos céus a tua majestade”. O que quer dizer que a glória da natureza não é inerente,mas derivada. O sentimento da presença de Deus tão presente no salmista e em sua vida espiritual é que Deus é da sentido ao mundo natural.

II. A criação revela a glória de Deus.

A) A glória de Deus vista na natureza é:

1. Indescritível. “Quão magnífico”! Nenhum poeta, nenhum santo pode falar adequadamente dessa glória. É profunda demais para ser dita em palavras humanas.

2. Graciosa. “Quão magnífico”! A terra, inda que distante do projeto original de Deus, declara a glória dele.

3. Universal. “Em toda a terra”. Em toda parte, sob o céu a glória de Deus pode ser vista.

“Conhecida na terra por milhares de sinais; por milhares nos céus. Quem tem os olhos abertos não precisa de um instrutor que lhe mostre, a menos que precise de um coração” (citação de Spurgeon).

III. A criação se desperta, admirada com o amor de Deus por seus filhos.

“Ó Senhor, Senhor nosso”. Os descrentes usam a natureza para esconder Deus; mas a natureza se regozija com os santos, quando estes refletem a obra do Pai. A natureza lembra ao filósofo cético do que é eterno, infinito e absoluto, mas o santo responde: “Este Deus glorioso é nosso; nosso Pai e nosso Amigo”.

V. 2: A defesa dos pequeninos e crianças

Versículo 2: “Da boca de pequeninos e crianças de peito suscitaste força, por causa dos teus adversários, para fazeres emudecer o inimigo e o vingador.”

Davi está falando literalmente de crianças, e o Senhor falou sobre isso: “Ouves o que estes estão dizendo? Respondeu-lhes Jesus: Sim; nunca lestes: Da boca de pequeninos e crianças de peito tiraste perfeito louvor?”.

O salmista está falando da grandeza da glória de Deus na criação e de repente se volta para as crianças; sim, porque elas são “as pequenas majestades”. Observe:

I. A capacidade religiosa de uma criança.

O primeiro suspiro de um bebê é por Deus e o reconhece na glória do universo. A espiritualidade das crianças é sempre vista nas páginas do AT. E no NT Jesus reconhece a espiritualidade delas. O poeta reconhece a graça e inocência natural das crianças. O pintor, beleza física. Os pais elogiam seus filhos pelo afeto que têm por eles. Mas, Cristo deu às crianças um lugar no seu sistema de ensino, com base na faculdade espiritual delas.

II. O culto de uma criança.

“Para fazeres emudecer o inimigo e o vingador”. A admiração instintiva das obras de Deus, mesmo pelas criancinhas, é forte defesa contra os que questionam a Deus ou a sua glória.

As crianças fazem emudecer o vingador. Quantas vezes vimos uma criança fazer uma pergunta direta, que nem sabemos responder? Ficamos calados.

Quando Melanchton estava preocupado com o futuro da Reforma Protestante, passou certo dia por uma casa e viu algumas crianças orando para que a Reforma triunfasse. Ele procurou Lutero e lhe disse: “Estamos salvos. As crianças estão orando por nós”. Algo aconteceu, também no grande avivamento liderado por João Wesley e George Whitfield. Certa ocasião quando Whitfield pregava na Nova Inglaterra, uma senhora ficou convicta de pecado e de que precisava orar. Mas, ninguém queria orar com ela, a não ser sua filhinha de dez anos de idade. Todos os dias essa criança se fechava em seu quarto derramando lágrimas diante de Deus. Ao vir que sua mãe estava salva, ela lhe disse: Vou contar pra todo mundo sobre o amor de Deus e de que ele perdoa nossos pecados. A mãe lhe disse: – Filha, ninguém vai acreditar em você.

A menina saiu e foi ao sapateiro. Disse pra ele: Você está irremediavelmente perdido, se não se arrepender. O sapateiro se arrependeu e começou a pregar pra sua vizinhança, e em poucos meses mais de cinquenta pessoas haviam se convertido ao Senhor, com profundo arrependimento e confissão de pecados.

Whitfield, pregando em Moorsfield disse: “Vários meninos e meninas se assentavam aos meus pés no púlpito enquanto eu pregava. Elas me entregavam os papéis em que as pessoas faziam seus pedidos – e mesmo sendo atingidas por ovos, sujeira, etc. que jogavam contra mim, elas nunca desistiram; ao contrário, cada vez que eu era atingido, olhavam-me com ternura, pois queriam elas ser atingidas com o que jogavam contra mim. Deus fez delas verdadeiros mártires pra ele, porque da boca dos pequeninos ele tira o perfeito louvor.

Existe uma festa em Naumburg conhecida como “Festa das Cerejas”, quando as crianças desfilam com as mãos e cestas cheias de cerejas, celebrando o seguinte fato histórico: Em 1432 Os hussitas ameaçaram destruir a cidade de Naumburg, quando um dos cidadãos propôs que todas as crianças da cidade deveriam se vestir de luto, e enviadas para pedir clemência ao inimigo. Procópius Nasus, chefe dos Hussitas ficou tão comovido com aquela atitude, que acatou o pedido de clemência, presenteando-as com frutas e lhes prometendo poupar a cidade. As crianças voltaram com coroas de folhas de cerejeiras gritando: “Vitória!” Por isso, as crianças são embaixadores de Deus, e suas palavras, orações, lágrimas costumam amolecer o coração endurecido do inimigo.

Em toda casa em que houver uma criança, tem ali um capelão.

Versículos 3-9: A dignidade da natureza humana

(Por serem muitos textos não vamos colocá-los aqui. São citados ao longo do comentário).

I. “Que é o homem?”.

O texto fala do homem, de sua impotência, fragilidade e mortalidade. “Filho do homem”, isto é, filho de Adão, e se refere à sua natureza terrena, formado a partir do barro.

“Que é o homem”?. À primeira vista a pergunta parece falar de um senso de fraqueza e insignificância diante da vastidão e do esplendor, do mistério profundo, e da glória dos céus, como se vê à noite. Compare a vastidão da criação com a pequenez do homem; o poder da criação com a limitação do homem; a duração da criação com o tempo limitado da existência humana. Vem geração e vai geração, mas a terra permanece para sempre.

II. A essencial grandeza da natureza humana (vv 5-9).

Inda que parecendo tão pequeno, aos olhos de Deus, como o homem é grandioso, um pouco menor em sua natureza do que a Divindade, e senhor da criação.

A) Tal grandeza pode ser vista:

1. Na qualidade de seu ser. O homem participa da natureza de Deus. “Um pouco menor do que os anjos”; “menor do que Deus” (v 5). Sabe-se que a versão ampliada (AV): “Tu o fizestes um pouco menor do que Elohim”, afirma o original. Algumas versões dizem anjos, mas o certo mesmo é Deus. “Menor do que Deus”. Shakespeare disse: “Nobre na razão, infinito em conhecimento; como anjos na ação, e como Deus em compreensão”.

2. Na grandeza de seu domínio: “Deste-lhe domínio” (vv 6-8). O homem é rei sobre a vasta terra. O homem é o vice-regente de Deus sobre a terra, o mar e o ar (Gn 1.26-28; 9.2). O que quer dizer: “Sob seus pés tudo lhe puseste”. Não para que ele destrua tudo com seus pés, mas que tenha domínio de tudo que está sob seus pés.

III. A fonte da grandeza da natureza humana.

Deus se preocupa com o homem. Tudo o que homem tem procede de Deus; e só permanece se Deus o abençoar. Quando reconhecemos que tudo vem dele, nós depositamos nossas coroas aos seus pés, como no v 9.

A natureza humana à luz do cristianismo

Este Salmo é citado frequentemente no NT e pode ser considerado um Salmo eminentemente cristão. Costuma-se acusar que o cristianismo trata com severidade a natureza humana, ignorando a dignidade de nossa natureza, etc. Mas, bem ao contrário, a história cristã demonstra que o cristianismo sempre valorizou o ser humano. Como Deus também considera e valoriza o homem.

I. O cristianismo reconhece a intrínseca grandeza da natureza humana.

Ele fala da espiritualidade, da infinidade e da imortalidade do homem. O homem é feito à imagem de Deus espiritualmente, infinitamente e imortalmente.

II. O cristianismo restaura a grandeza perdida da natureza humana.

A) Restaura:

1. A glória de seu caráter. (a) Cristo se torna o padrão de vida. Que glorioso é o caráter humano quando olhamos para Jesus. (b) Cristo se torna o aperfeiçoador da vida. Ele é o modelo e o poder que nos transforma à imagem de Deus.

2. A plenitude de seu domínio. Isto foi perdido. Um pequeno fragmento de sua soberania ainda permanece no homem, apesar da queda. O cristianismo reconhece o direito do homem em governar, e insiste para que o homem ocupe seu lugar no projeto criacional de Deus. (a) Neste mundo. Ainda que muitos cientistas neguem que o objetivo final da terra seja a existência do homem, o cristianismo insiste no contrário. À medida que o evangelho progride, a terra fica cada vez mais sujeita ao homem. (b) No mundo espiritual e eterno. A consciência e a centralidade do NT é Jesus, o restaurador de tudo o que se perdeu.

No fim, não apenas o reino animal ou o mundo como um todo, mas o universo com todo seu poder ficará sujeito e não mais hostil a Deus, até mesmo a morte e o seu poder (1 Co 15.27 cf. Ef 1.22).

Somente em Cristo a magnificência humana cumpre seu destino. O que este Salmo diz das conquistas do homem, só podem ser auferidas em Cristo, nosso Senhor.

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