Sobre Davi e Bate-Seba

2 Samuel 11

Existem dois episódios tristes em Davi que mancharam seu reinado: o adultério com a jovem Bate-Seba e o recenseamento para conhecer seu poderio de guerra. Davi, de quem a Bíblia afirma ser homem segundo o coração de Deus, levantado em Israel para cumprir a vontade de Deus falhou, como qualquer mortal falha.

Por que Deus deixou estes dois episódios registrados nas Escrituras? Primeiro, para mostrar que somos falhos e que dependemos a cada momento da misericórdia e da capacitação divina, e também para mostrar àqueles que só querem que sejam registrados os episódios positivos de sua vida que Deus faz jogo-aberto, elogiando quando o homem tem de ser elogiado e desmascarando quando o homem tem de ser desmascarado. Os ditadores censuram as notícias ruins a seu respeito, por medo. Deus não está nem aí pra eles. Existem algumas coisas neste episódio com Bate-Seba que deixam exemplos positivos a todos nós, obreiros do Senhor.

1. Era tempo de guerra e não tempo de descanso. Os reis saíam para a guerra a partir da primavera, definindo conquistas e reafirmando as fronteiras de seu país. Davi ficou em casa. “Decorrido um ano, no tempo em que os reis costumam sair para a guerra, enviou Davi a Joabe, e seus servos, com ele, e a todo o Israel, que destruíram os filhos de Amom e sitiaram Rabá; porém Davi ficou em Jerusalém” (11.1).
Davi não apenas errou em não liderar o povo para a guerra, como deixou de cumprir as exigências das leis de guerra de Deuteronômio 20. Deus determina que os líderes de Israel sejam os primeiros a anunciar a guerra e dela participar. Observe neste texto de Deuteronômio 20 as expressões “Quando vos achegardes à peleja, o sacerdote se adiantará, e falará ao povo… Os oficiais falarão ao povo; e continuarão os oficiais a falar ao povo…” (Dt 20.2,5, 8).
O líder é o primeiro a se expor na batalha espiritual. Ele é o primeiro a sair para a guerra. Ele deve dar exemplo em tudo. Em toda atividade da igreja o líder tem que assumir o comando e ir à frente, encorajando os membros da igreja a fazerem o mesmo. Na oração, no jejum, na adoração, em tudo.

2. Ele ficou em casa, descansando. Existe tempo de guerra e tempo de paz. A ocasião era de guerra. Ao ficar em casa descansando Davi se expôs ao pecado. Dormiu a tarde toda e se levantou com muita energia, sexualmente recuperado. “Uma tarde, levantou-se Davi do seu leito e andava passeando no terraço da casa real; daí viu uma mulher que estava tomando banho; era ela mui formosa” (v 2). Davi nada tinha a fazer, senão descansar e passear no terraço. Obviamente quando um homem nada tem a fazer, arrumará alguma coisa para encher o tempo. Hoje, os pastores que nada têm a fazer ficam se prostituindo virtualmente na telinha do computador; perambulando pelos shoppings ou se recreando em suas chácaras… Nada há de errado na recreação, a questão é que tipo de recreação se escolhe.

3. Davi ficou sabendo quem era aquela mulher. Seus secretários lhe avisaram: “É Bate-Seba, filha de Eliã e mulher de Urias, o heteu. Então, enviou Davi mensageiros que a trouxessem; ela veio, e ele se deitou com ela” (vv 3 e 4). Davi sabia quem era Urias e sabia também quem era Eliã, mesmo assim, enquanto o esposo daquela jovem estava no front da guerra, ele atraiu-a para os seus braços e adulterou com ela. A partir do adultério uma série de eventos teve lugar. Senão vejamos:

a) Davi traiu a si mesmo. Davi ficou tão obcecado pela beleza da jovem mulher – e Davi devia andar lá pelos 40 anos de idade em pleno vigor sexual – que ordenou que a mulher lhe fosse trazida ao seu camarim. O pecado está sempre diante dos homens de Deus. E como Deus afirmou a Caim, “a ti cumpre dominá-lo” (Gn 4.7). Davi não se dominou. Dias depois, arrependido, orou: “Lava-me completamente da minha iniqüidade e purifica-me do meu pecado” (Sl 51.2). O pecado leva o homem a trair a si mesmo. Paulo fala que a morte tem um aguilhão cujo nome é pecado, e este aguilhão empurra o homem para a morte (1 Co 15.56).

b) Davi traiu a confiança de Deus. Depois que adultera e satisfaz a carne; depois de matar o esposo daquela bela mulher, é confrontado pelo profeta Natã e cai em si; como dizem os jovens, “caiu na real” e declarou arrependido diante de Deus: “Pequei contra ti, contra ti somente, e fiz o que é mal perante os teus olhos…” (Sl 51.4). Quando o homem adultera ou peca não peca contra si mesmo, apenas, mas peca contra a santidade de Deus. Anos antes José do Egito havia dito à mulher de Potifar quando ela o agarrou com volúpia, dizendo: “Deita-te comigo”. A resposta que lhe custou vários anos na prisão foi: “Como, pois, cometeria eu tamanha maldade e pecaria contra Deus?” (Gn 39.9). Quando o obreiro entende que ao pecar está ofendendo a santidade de Deus, ele tem mais chances de vencer a tentação.

c) Davi traiu seus três melhores amigos. Sim, porque o avô de Bate-Seba, Aitofel, era conselheiro da coorte. Eliã o pai de Bate-Seba e Urias o marido da jovem faziam parte dos melhores guerreiros de Davi. Certamente Aitofel para galgar este posto na coorte devia estar acompanhando a Davi desde os tempos em que este era perseguido por Saul. Havia uma longa história de amizade e de aliança entre o rei e Aitofel. Agora, anos depois, Aitofel estava orgulhoso de seu filho Eliã que se tornara um guerreiro e sua neta Bate-Seba se casara com outro guerreiro da mesma estirpe, Urias.
No livro de 2 Samuel 23 a partir do versículo 24 começa a listagem dos grandes guerreiros de Davi, e ali dois nomes se destacam: “Eliã, filho de Aitofel, gilonita” (v 34) e Urias, heteu (v 39). Quando se examina o texto do capítulo 11 em que Bate-Seba é identificada como “filha de Eliã e mulher de Urias” (11.3), percebe-se que Davi traiu três famílias: Aitofel, seu filho Eliã e o marido de Bate-Seba, Urias.
Ele não teve temor algum em relação aos seus guerreiros. Mandou matar a Urias pelas mãos dos homens de Moabe que defendiam a cidade de Rabá. “A Urias, o heteu, feriste à espada; e a sua mulher tomaste por mulher, depois de o matar com a espada dos filhos de Amom” (12.9). Não respeitou a Eliã, o pai da jovem, guerreiro contado entre os melhores de Davi.
Não é sem razão que Aitofel esperou vários anos para se vingar de Davi. Quando Absalão destronou a Davi assumindo o reino, ele aconselhou ao filho de Davi, Absalão que tivesse relações sexuais com as concubinas de seu pai no terraço da casa para que todos notassem que Absalão detestava o pai.

“Então, disse Absalão a Aitofel: Dai o vosso conselho sobre o que devemos fazer. Disse Aitofel a Absalão: Coabita com as concubinas de teu pai, que deixou para cuidar da casa; e, em ouvindo todo o Israel que te fizeste odioso para com teu pai, animar-se-ão todos os que estão contigo. Armaram, pois, para Absalão uma tenda no eirado, e ali, à vista de todo o Israel, ele coabitou com as concubinas de seu pai. O conselho que Aitofel dava, naqueles dias, era como resposta de Deus a uma consulta; tal era o conselho de Aitofel, tanto para Davi como para Absalão” (2 Sm 16.20-23).

Aitofel era homem de peso no reino de Davi e durante vários anos – pelo menos 10 anos desde que sua neta foi induzida ao adultério – ele se calou. Ficou quieto, analisando aquela situação e se vingou de Davi na hora em que Absalão tomou o reino. Por isso, ao saber que Aitofel estava entre os que apoiavam a Absalão, Davi orou: “ Ó Senhor, peço-te que transtornes em loucura o conselho de Aitofel”. Davi sabia do peso da palavra de seu conselheiro, e agora, circunstancialmente, tinha um parente na família real.

4. Davi atraiu maldição divina sobre si e sobre o restante de sua casa. Aqueles que acham que estão imunes à maldição, observem o que aconteceu a Davi, pois os acontecimentos a partir daí são trágicos na família dele. Gade, o profeta, proferiu a sentença contra Davi: “Agora, pois, não se apartará a espada jamais da tua casa, porquanto me desprezaste e tomaste a mulher de Urias, o heteu, para ser tua mulher. Assim diz o SENHOR: Eis que da tua própria casa suscitarei o mal sobre ti, e tomarei tuas mulheres à tua própria vista, e as darei a teu próximo, o qual se deitará com elas, em plena luz deste sol. Porque tu o fizeste em oculto, mas eu farei isto perante todo o Israel e perante o sol” (2 Sm 12.10-12).

Seu filho Amom violentou sexualmente sua meia-irmã Tamar (2 Sm 13). Seu outro filho, Absalão, demorou dois anos, mas vingou-se de Amom convidando-o para uma festa onde mandou que ele fosse morto (2 Sm 13.23-36). Absalão teve que fugir para outro país onde ficou três anos em exílio forçado (2 Sm 13.37-39). Depois de regressar, Absalão fica ainda dois anos em Jerusalém sem ser recebido pelo pai em palácio. Quatro anos depois ele dá o golpe e destrona o pai que tem de fugir para não ser morto (2 Sm 15.7). Em onze anos de reinado, Davi só teve problemas com seus filhos.
A maldição foi terrível, pois Absalão tomou as concubinas do pai e teve relação sexual com elas à vista de todo povo. Aitofel, seu melhor conselheiro se enforcou ao perceber que seu conselho não dera certo (2 Sm 17.23).
Como se vê a família de Aitofel, seu filho Eliã, o genro deste e sua neta Bate-Seba haveriam de sofrer as conseqüências de um homem que pecou!

5. Davi desonrou o nome de Deus. Quando o líder peca, e seu pecado se torna conhecido da sociedade ele desonra a Deus e faz que as pessoas rejeitem o evangelho e a igreja pelo escândalo que provocam. Foi isto que Gade falou a Davi: “Mas, posto que com isto deste motivo a que blasfemassem os inimigos do SENHOR, também o filho que te nasceu morrerá” (2 Sm 12.14). Quanta gente sofrerá na Eternidade por rejeitarem a Deus e a salvação, escandalizados com os pecados dos líderes religiosos desta nação.
Quantas desgraças acontecem ainda hoje na igreja quando os líderes pecam. Esquecem os líderes que quanto maior a responsabilidade espiritual, maior o rigor da justiça divina.

Voltaremos ao tema.

6 thoughts on “Sobre Davi e Bate-Seba

  1. Parabens pela forma como Deus o inspirou nesta explanação, e também pelas pesquisa realizada para trazer estas informações. Que a Graça do Senhor continue a ser derramada sobre tua vida e teu Ministério.

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