Política e Religião

Durante séculos algumas sociedades ocidentais – católicas e protestantes – existiram sem fazer separação entre o Estado e a religião. Isto porque, quando estudamos as civilizações descobrirmos que algumas nações católicas e protestantes não conseguiram, na prática, fazer esta separação. No Brasil, a influência da igreja de Roma é muito forte sobre o estado laico, da mesma forma que o protestantismo em outros países. Da mesma maneira, países de religião islâmica não conseguem separar o Estado da religião, sendo os dois também uma só coisa. E são piores, porque não admitem que se usem publicamente os símbolos cristãos.

Os governos de todas as épocas misturavam religião e política de maneira natural, e nem conseguiam ver diferença alguma entre um estado laico e o religioso. Com o advento da República as nações católicas e protestantes vêm tentando trabalhar esta diferença, sem muitos resultados práticos. Civilizações antigas como o Egito, a Caldéia, Grécia e Roma eram governadas por místicos que, a pedido de reis e imperadores prognosticavam o que os governos deveriam fazer.

Estou escrevendo este artigo, a propósito da decisão de um juiz do RS que vem orientado os magistrados a tirarem das salas de audiência e dos tribunais o crucifixo alegando que o estado é laico e este é um símbolo religioso. E ele não está errado, apesar da opinião pública se levantar contra a decisão. Ele está correto. Religião e Estado são separados aqui no Brasil, ou pelo menos deveriam ser. E também para lembrar da influência que teve o bispo de Barra, no Nordeste, impedindo o projeto de transposição do Rio São Francisco, assunto que trato em outro artigo. A influência do catolicismo é ainda forte no independente Estado laico brasileiro.

É preciso viajar no tempo e ver como Demócrito (460-371 a.C.) o criador da primeira doutrina materialista, e seu discípulo Epicuro, fundador do epicurismo já pensavam em separar Estado e religião. Este dizia: “comamos e bebamos que amanhã morreremos”. Mas não conseguiu distanciar-se da religião, porque depois que morreu, a escola de Epicuro pregava que o homem vivia aterrorizado por uns deuses, que ele sabe, estão ausentes em seu destino, e o homem deve seguir seu caminho esquecendo os deuses. Ele foi no passado, o que Augusto Comte o foi em anos mais recentes: criou a filosofia do positivismo em que o homem não precisa de um deus. Filosofia que ainda é forte em certos personagens da política brasileira.

Tito Lucrécio Caro (98-55 a.C.), pregava que o homem é ignorante e daí o temor que tem pelos deuses, e pregava que em nome da religião cometiam-se os mais horrendos crimes, por isso os homens precisam ficar livres da religião.

Durante toda a idade média, a igreja controlou a cultura e os costumes europeus, mas estes laços foram se enfraquecendo, e a imagem de Deus foi-se apagando. Mas é no período do renascimento que começa a luta entre ciência e religião. Quem desafiasse a religião era morto pela igreja, aliás uma prática ainda bem presente na sociedade dos dias de hoje, com outros métodos que ainda silenciam os que desafiam Roma.

Por este tempo, diversos cientistas, entre eles Berzélio e Mitscherlich debochavam da tese criacionista bíblica, afirmando que a geração espontânea fora provada. Em 2 de março de 1875 Pouchet, adepto daqueles cientistas, fez uma demonstração pública com uma vasilha de água. Em alguns dias a água fervilhava de germes vivos; era a vitória da ciência sobre a religião. Luis Pasteur imediatamente levou à praça pública uma vasilha de água esterilizada. Toda a Europa esperava o surgimento de seres vivos na vasilha de Pasteur. Nada aconteceu. No dia 30 de março Pasteur explicou que não havia geração espontânea, e que os germes eram fruto da putrefação. A Bíblia triunfou sobre a ciência.

Nos dias de hoje, apesar do papel da ciência ser bem definido e operar livremente fora da religião, esta ainda impõe condições impedindo que os governos tomem decisões na área da saúde e em outros quesitos mais. Mas o contrário também é verdadeiro, porque até hoje a teoria da evolução ensinada nas escolas não tem comprovação científica plena, e o sofisma da evolução que contraria o criacionismo foi-nos imposta pela ciência, e aceita pela estado como uma grande verdade. Como se vê, ciência, estado e religião têm ainda um longo caminho pela frente.

Separar o estado da religião não é tarefa fácil. Sempre houve uma tentativa de separá-los, pela força, como fizeram Engel e Marx, resultando daí que todas as ideologias, tentaram separar estado e religião, acabando elas, próprias, por tornarem-se a “nova” religião. Foi assim com o positivismo de Comte, cujos templos do positivismo passaram a ser construídos em vários países, e o comunismo ateu que se tornou também a nova religião atéia dos governantes.

Pode constar na constituição do Brasil que são duas coisas independentes, mas não se consegue separar o que a cultura religiosa brasileira estabeleceu, já que, cultura e religião andam de mãos dadas desde tempos remotos. Os símbolos religiosos católicos que insistem em permanecer nas repartições públicas, hospitais, escolas e no judiciário provam o que quero dizer. O juiz está certo em querer afastá-los, pois o Estado é laico e não religioso, no entanto esbarra no povo e em seu líder máximo, o Presidente Lula que aparece em público com uma imagem de Aparecida na lapela do casaco, o que não deixa de ser uma ofensa às demais religiões. Temos que admitir que política e religião ainda precisam andar de mãos dadas; são votos nas urnas.

Bacon fundou a escola racionalista na Inglaterra (1561-1626) buscando banir do homem a idéia do sobrenatural e da revelação. Seu discípulo, Thomas Hobbes (1588-1679) escreveu a obra O Leviatã usando o monstro da Escritura como metáfora do Estado, que nega a individualidade e devora os seres humanos. O homem devora o próprio homem como lobo, pois o homem transfere seus direitos para o Estado, mudando sua condição natural para uma condição civil. Nunca o Leviatã, o Estado, tem sido tão devorador como hoje no Brasil. Interfere em tudo na vida do povo, até mesmo no direito de ter sua própria religião. Pois no momento em que o Presidente usa uma imagem de Aparecida no peito ofende a outra parcela da população.

Mas esta questão de política e religião ganhou formas com Carl Marx (1818-1883). Ele conheceu Engels em 1844 e juntos fundaram a liga dos comunistas com um programa político e filosófico em 1848. Criador do marxismo, pregava que a crítica do céu deve ceder seu posto a terra; a crítica da religião ceder ao direito; e a teologia à política. Para eles, religião é alienação, uma realização fantástica do ser humano, porque ainda não possui a verdadeira realidade. A religião é o ópio do povo.

Assim, pela ótica do ateísmo marxista (que hoje governa o Brasil) a política se opõe a Deus e a religião, mas não abre mão deles para continuar no poder. A evolução do pensamento filosófico e científico evoluíram para o materialismo e o ateísmo, exercendo forte influência nos movimentos políticos da história, cujo exemplo máximo é o presidente atual da Câmara dos Deputados, Aldo Rabelo, cujo partido foi criado no rastro do sangue derramado dos mártires cristãos da Albânia de Ever Hoxa.

Se pelo menos o Estado não interferisse na religião e a religião não interferisse no Estado, quem sabe o povo viveria melhor, as formas de culto seriam respeitadas, a ciência contribuiria para o bem-estar da sociedade e a religião deixaria de ser palanque em época de eleições. Mas numa sociedade que mescla religião e política, cultura e religião, em que o Estado laico ainda é subserviente da religião patrocinando encontros, reuniões, e viagens de representantes de líderes afro nas viagens presidenciais, tirar o crucifixo das paredes é mera hipocrisia.

Um Estado que se diz laico não poderia ter feriados em homenagem a santos, o que comprova, por fim que a mão dos líderes católicos comandados por Roma ainda são os dominadores do pensamento, da filosofia, da teologia e do estilo de vida do povo brasileiro. O juiz que optou por tirar os crucifixos deveria ir mais além, entrando com uma representação contra o governo que, laico, mantém-se religioso para permanecer no poder.

É isto mesmo! O laico Estado brasileiro, precisa da religião, apesar de fazer o possível de agir contra ela!

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