Eu estava relendo Moby Dick, de Herman Melville em cujo romance ele traça a trajetória do capitão Ismael que sai à caça do maior cachalote do mundo. Antes de sair ao mar o capitão assiste a um culto na pequena igreja da vila de pescadores. Na descrição de Melville o púlpito fica numa parte alta da igreja, como se fosse na amurada de um navio. O pastor subiu por uma escada de madeira colocada junto à parede, como a de um navio por onde sobe o prático. A escada terminava no meio da parede, e dali o pregador alcançava o púlpito por uma escada feita de cordas vermelhas, que a esposa de um marujo tecera. Lá no alto, recolhe a escada de cordas e fica só, intocável, acima da congregação, no púlpito. Melville assim descreve o púlpito:
“Do púlpito saía uma saliência frontal, como projeção de obra ornamental, que imitava o exporão de uma nau, encimado por um anteparo de mesa. Que podia existir de mais significativo? – Pois o púlpito é sempre a parte mais adiantada da terra; tudo o mais vem depois dele: O púlpito conduz o mundo. Dele se divisa em primeiro lugar a tempestade da viva cólera de Deus, e a proa deve aguentar o primeiro impacto. Dele é que primeiro se clama por ventos favoráveis ao Deus das brisas propícias ou adversas. Sim, em sua travessia, e não viagem completa, o mundo é um navio; e o púlpito é a proa dele”.
O autor percebia que o mundo é conduzido através da mensagem pregada no púlpito, por isso sua frase ficou célebre: O púlpito conduz o mundo. O púlpito foi agente transformador nas mãos de pregadores comprometidos ao longo da história.
O que estamos fazendo com o púlpito? Que material dispomos em nossas pregações que podem conduzir o mundo? Na realidade, nos dias de hoje o que se vê são pregações vazias, repetitivas, algumas inspiracionais e motivadoras que apelam à alma humana, mas não transformam o espírito humano. Sim, porque num país como o nosso que dizem haver milhões de pessoas membros de igrejas pentecostais e históricas, teríamos conduzido os rumos de nossa nação pela pregação transformadora. Raramente se ouve alguém pregar sobre justiça social, distribuição de renda, escravidão no campo, distribuição de terra ou reforma agrária à luz das Escrituras. Sim, raramente se ouve uma mensagem que provoque na congregação uma ação social, como as pregações transformadoras do passado que eliminaram a escravidão, a exploração trabalhista e que resgataram a dignidade do ser humano.
E as mensagens que abordem a salvação pelo sangue de Cristo, a necessidade de arrependimento e de volta à Deus, raramente são pregadas nas igrejas. Nossos cantores famosos se apresentam em rodeios, festas municipais seculares e jogam as pérolas inspiradas que Deus lhes deu ao lixo. Os pregadores transformadores estão desaparecendo.
A palavra de Deus em alguns círculos está presa, diferentemente de Paulo que estava preso, mas a palavra de Deus, não. Por isso afirmou: “… pelo qual estou sofrendo até algemas, como malfeitor; contudo, a palavra de Deus não está algemada” (2 Tm 2.9). Pastores não mais pregam a verdade do evangelho de Jesus Cristo, e aprisionam a palavra, porque comprometeram a si mesmos e a igreja ao sistema do mundo. Hoje os pregadores estão soltos e a palavra de Deus presa; nos dias de Paulo os pregadores estavam presos e a palavra de Deus solta!
“Outra razão ainda temos nós para, incessantemente, dar graças a Deus: é que, tendo vós recebido a palavra que de nós ouvistes, que é de Deus, acolhestes não como palavra de homens, e sim como, em verdade é, a palavra de Deus, a qual, com efeito, está operando eficazmente em vós, os que credes” (1 Ts 2.13).
Se a palavra de Deus não estivesse presa teríamos transformado a sociedade brasileira. Hoje nós os pregadores estamos soltos, mas a palavra está presa. Presa às convenções entre homens, aos cargos políticos, à distribuição de verbas federais, etc. Presa aos conluios denominacionais.
As milhares de igrejas espalhadas Brasil a fora poderiam num só domingo revolucionar o Brasil se os pregadores soubessem conduzir o mundo pela pregação do evangelho. Foi isto que aconteceu, em certo sentido, com os pregadores da igreja que nascia pujante. A mensagem de Filipe em Samaria provocou “grande alegria naquela cidade” (At 8.8). Os cristãos dispersos pela perseguição que sobreveio depois da morte de Estevão iniciaram a igreja de Antioquia. A cidade foi de tal modo afetada, que os discípulos passaram a ser chamados de “pequenos cristos” ou cristãos (At 11.26). A fama dos pregadores correu pelo Império romano: “Estes que têm transtornado o mundo chegaram também aqui” (At 17.6).
Para que nossa mensagem transtorne o mundo ela tem de ser transformadora. Durante décadas o movimento pentecostal cresceu célere na nação através da pregação simples e direta do evangelho de Jesus Cristo. Hoje os grandes pregadores mexem com a audiência, mas, ao que parece os frutos de convertidos e transformados é pequeno.
Falar contra as injustiças do governo e contra os projetos que tentam barrar o avanço da igreja? Falar contra os projetos em que o Estado quer interferir na educação dos filhos? Os pregadores não falam, porque estão “presos” aos compromissos com o Estado.
O verdadeiro evangelho de Jesus Cristo é transformador. Que a palavra esteja livre, e nós também, porque, o púlpito conduz o mundo.